3. Origens e influência do EZLN
A revolução mexicana de 1910 foi o inicio da luta pelo direito a Reforma Agrária, da divisão de terras para a população. Neste movimento surgiu a figura ilustre de Emiliano Zapata, revolucionário que lutou contra a segregação dos povos indígenas do sul do México e contra a oligarquia agrária da região de Morelos, no estado de Chiapas.
As influências do EZLN estão simbolicamente ligadas aos ideais de Emiliano Zapata que lutava por “Terra y liberdad” assim:
Neste sentido, nos parece que os neozapatistas retomam a tradição da Revolução de 1910-1920 e os postulados básicos propugnados por Emiliano Zapata para desta forma tocar no imaginário social e simbólico mexicano e trazer para si elementos desse imaginário de longa tradição nacional de luta e revolução. Trata-se, porém, muito mais de uma redefinição de seus símbolos, do que uma ligação direta com os preceitos zapatistas originais. Ainda assim, os novos zapatistas retomam a bandeira de uma revolução interrompida, a bandeira que clama por “Terra e Liberdade”. (Hilsenbeck Filho, Alexander, ABAIXO E À ESQUERDA UMA ANÁLISE HISTÓRICO-SOCIAL DA PRÁXIS DO EXÉRCITO ZAPATISTA DE LIBERTAÇÃO NACIONAL, cap. A herança de Emiliano Zapata e a relação com o território, p 27, 2007)
Os preceitos estão pautados nos idéias zapatistas, entretanto, se difere em alguns princípios, pois hoje a luta pela Reforma Agrária é contra um sistema econômico Neoliberal, que exclui os indígenas de sua maior fonte de vida, a terra, por motivos econômicos e comerciais. Entretanto, a essência da luta e do movimento está pautado na terra, assim como na revolução mexicana.
O zapatismo está engendrado na sociedade mexicana, um símbolo que ficou marcado desde a Revolução, alguns historiadores usaram o termo de memória coletiva, como Miche LOWY (marxista, brasileiro que trabalha como diretor de pesquisas do Centre National de la Recherche Scientifique.), sendo assim, a luta pela terra já está enraizada na mentalidade da sociedade mexicana. Para justificar tal conceito usarei de uma referencia musical da banda Rage Against the Machine, que expressa em suas letras à luta contra o capitalismo e a luta das sociedades indígenas, e do zapatismo veja:
Sangue de Zapata (RATM)
Sangue de Zapata /Não foi derramado em vão
Da dívida do mais pobre /Guerrearemos
Para recuperar nosso nome /Sangue de Zapata
Não foi derramado em vão /Da dívida do mais pobre
Guerrearemos/Para recuperar nosso terreno
Em 1º de Janeiro de 1994
Os camponeses indígenas no Sul do México
Declararam guerra ao injusto/E ilegítimo governo
Da dívida dos mais selvagens, os mais pobres
Veio um braço justo na luta
Por democracia, justiça e liberdade
E isso não vai parar até que a ditadura de 65 anos,
O Partido Revolucionário Institucional
Esteja caindo por terra
E a voz do povo será ouvida mais uma vez
Então se liga nisso
1º de Janeiro, eles se tornaram conhecidos como
O Movimento Zapatista
E eles têm algo a dizer, e eu quero vocês todos para
Cantarmos juntos rápido realmente
Ficaria mais ou menos assim
Vai, tudo para todos...
E nada para nós.
Tudo para todos, e nada para nós!
(http://letras.terra.com.br/rage-against-the-machine/68916/traducao.html, acesso em 09/07/2011)
A banda Rage Against the Machine de rock, exaltando a luta zapatista e o movimento do EZLN em suas músicas e deixa claro o simbolismo do zapatismo enraizado em sua mentalidade e sua influência para o movimento.
Contudo, da onde aparece este grupo armado?
As origens do EZLN se remontam ao Congresso Indígena de San Cristóbal de las Casas (Chiapas/ México), assim o Congresso:
“ocorrido em 1974, marcou uma ruptura que fez com que comunidades indígenas chiapanecas desenvolvessem uma resistência, unindo as etnias participantes, uma vez que estas últimas passaram a perceber interesses comuns e a necessidade de unirem-se para melhor resistir à exploração, marginalização e preconceito a que estavam sujeitas. Estas mesmas etnias foram as que entraram em contato com o grupo de origem urbana que foi habitar a Selva Lacandona em Chiapas e, juntos, deram ao EZLN as características com as quais ele mostrou-se ao mundo em 1994.”( Origens do EZLN: o congresso indígena de San Cristóbal de las Casas. Andreo, Igor Luís. Especialização História/UEL)
Percebe-se que os povos indígenas viviam em conflitos étnicos e isso dificultava a luta contra a segregação destes, assim com o congresso indígenas as diferenças foram superadas unindo os povos indígenas na mesma luta, a luta pela sobrevivência, pela terra sua fonte de vida. Este foi um grande passo para o movimento zapatista, mais em contrapartida um grupo de marxista-leninista, em meados da década de 80 chegava a Selva Lancadona em Chiapas, este grupo visava mostrar seus problemas e suas lutas empreendidas na cidade, entretanto, suas propostas se diferiam das lutas dos povos indígenas, eram realidades diferentes. Este grupo que foi habitar a selva logo viu que precisaria se converter na luta indígena assim “passou por um processo de adequação à realidade material e cultural indígena chiapaneca, tornando-se um exército a serviço das comunidades indígenas.”(Andreo, Igor Luís. Especialização História/UEL).
Este grupo era um grupo urbano que teve sua origem na cidade de Monterey (então a segunda cidade mexicana mais industrializada), se chamava Frente de Libertação Nacional (FLN), que começou em 1960. Os primeiros grupos da FLN chegaram em Chiapas em 1974, mas foram reprimidos violentamente pelo exercito federal. Assim, alguns sobreviventes se deslocaram para regiões rurais, entre elas a Selva de Lancadona, tendo contato com as comunidades indígenas.
Outro grupo que teve papel importante para o desenvolvimento do movimento zapatista foi a Igreja Católica, que no inicio seu objetivo era catequizar os indígenas e impedir o crescimento de outras religiões como protestantismo, e os mórmons entre outros. Entretanto, houve um grande choque, pois os católicos queriam promover a cultura cristã e erradicar os indígenas de seus costumes e de sua cultura, sendo assim os indígenas não aceitaram e houve violentas brigas entre os grupos indígenas, prós e contra.
Ao final da década de 60, alguns fatores impulsionaram mudanças no pensamento da Igreja Católica, e com o Concílio Vaticano II houve uma abertura na mentalidade católica, assim sua postura perante aos acontecimentos sociais tomaram direções diferentes. Essa abertura propiciou um novo olhar perante as sociedades indígenas, e agora o objetivo não era catequizar os indígenas e erradicar sua cultura e seus costumes, e sim um olhar sobre a emancipação da cultura indígena, houve uma preocupação em manter viva a cultura indígena. Os representantes da Igreja Católica nas sociedades indígenas de Chiapas participavam de grupos políticos, sindicatos, e até de organizações revolucionaria, com a chamada “Teologia da Libertação”, este grupo católico tinha um posicionamento político e social ativo dentro das comunidades indígenas, e lutaram por melhorias para os povos indígenas, por melhor educação, saúde, moradia etc..
O que é a Teologia da Libertação?
“A teologia da libertação é uma doutrina religiosa que foi criada em resposta ao grande número de pessoas empobrecidas e marginalizadas presentes na América Latina. Para Michael Löwy, (LÖWY, 1991: 99) a relação que ela possui com o marxismo se deveu à necessidade de conhecer as causas da pobreza, para assim poder combatê-la eficazmente.” (Luis Andreo, Igor. Origens do EZLN: o Congresso Indígena de San Cristóbal de las Casas. p, 6)
Com a atuação deste grupo,
“A Igreja católica se encontra bastante enraizada no meio cultural e social mexicano - não sendo diferente no meio indígena. Teve por personagem principal, na região de Chiapas, o bispo da cidade de San Cristóbal de Las Casas, Samuel Ruíz, que se reorientou junto ao movimento de evangelização no sentido de buscar uma “indianização” com vistas a fundir o cristianismo com as culturas indígenas.
Desta forma, setores da Igreja Católica levaram em conta as próprias reivindicações sócio-econômicas das populações indígenas, pregaram uma tomada de consciência dos motivos dos problemas que lhes afligiam, mas, obviamente, distanciando-se de qualquer tipo de ação violenta. Não viam mais, em certa medida, os pobres como objetos de pura caridade ou pena, mas como os sujeitos de sua própria libertação, mas sempre dentro dos limites da própria instituição religiosa. (Hilsenbeck Filho, Alexander. ABAIXO E À ESQUERDA UMA ANÁLISE HISTÓRICO-SOCIAL DA PRÁXIS DO EXÉRCITO ZAPATISTA DE LIBERTAÇÃO NACIONAL, cap. O Cristo justiceiro: O papel da Igreja, p.106-107)
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Percebe-se que o desenvolvimento do movimento revolucionário mexicano teve varias influências como do grupo paramilitar FLN e representantes da Igreja Católica e os grupos indígenas que sofriam segregação social pelas elites mexicanas. A participação destes grupos e a união indígena que consolidaram o EZLN e a sua emancipação , contra o neoliberalismo. O processo histórico do EZLN e a luta se anunciará em 1994 quando o grupo paramilitar se levanta contra a proposta da classe dominante mexicana. Para o subcomandante Marcus “Aquilo que é o zapatismo em 1994 resulta da confluência de três componentes principais: um grupo político-militar, um grupo de índios politizados e muito experientes e o movimento índio da Selva”.
A origens do movimento neozapatista remonta ao congresso indígena de 74, da chegada de grupos urbanos revolucionários como a FLN migrando para as regiões do interior e da selva, da Igreja Católica que participou com alguns representantes da “Teologia da Libertação”, de cunho marxista, e que visava resolver e conscientizar dos problemas sociais e culturais que assolavam os povos indígenas. Mas a base para o movimento e reivindicação do EZLN e a terra e a emancipação dos povos indígenas e de uma política onde “haja tudo para todos”, e ainda a influência simbólica de Emiliano Zapata que está enraíza na mentalidade mexicana, do pós - revolução mexicana. Estes são os grandes fatores que influenciaram para o desenvolvimento do grupo revolucionário.